segunda-feira, 19 de outubro de 2020

NADA JUSTIFICA...



           Quando iniciei o meu desenvolvimento mediúnico no Centro Espírita Bezerra de Menezes, tive a oportunidade de conhecer e conviver com grandes mulheres que muito me ensinaram com seus exemplos e experiências. Dentre estas, uma bem jovem e mãe de três filhos pequenos, que mais tarde vieram a ser meus alunos do curso de evangelização, deixou-me bastante intrigada desde o começo. A primeira impressão que se tinha ao observá-la, era de que se tratava de uma pessoa normal, elegante e bonita. Mas, quando ela falava, aparecia um papo em seu pescoço e sua voz ficava um pouco rouca. À medida em que o tempo passava  e ganhávamos  um certo grau de intimidade uma com a outra, certa vez, criei coragem e perguntei-lhe se ela sofria de algum problema na tireóide que justificasse aquela saliência sempre presente nas conversações. Ela contou abertamente para todo o grupo a razão daquilo acontecer. Deixou-nos pasmos com a sua explicação. Na verdade, não era nenhuma doença. Ela sofria tanto por causa de seu casamento fracassado, marido violento e viciado em álcool que, um dia, não aguentando mais tanta pressão, resolvera tomar soda cáustica para ver se conseguia ir logo para o outro lado. Como não conseguira o seu intento, tinha que conviver, além do inferno em família, com a sequela que ficou de sua atitude impulsiva e nefasta. Naquela altura, ao ver a nossa expressão horrorizada de um silêncio estarrecedor e, antes que fizéssemos a pergunta que não queria calar, ela nos disse que não se separava do marido porque era espírita e esse era o seu carma. E seguia a vida aos trancos e barrancos, tendo três crianças para criar e sofrer junto com ela. Morou bastante tempo em Passo Fundo e depois se mudou para Porto Alegre, a princípio e acabamos perdendo o contato. Não sei o que aconteceu com ela depois disso. Outro caso semelhante foi de uma senhora muito querida e simpática que participava das nossas reuniões e tinha uma visível aparência de quem sofrera um derrame muito severo pois estava cega de um olho, o rosto repuxado para um lado como se tivesse tido um espasmo grave e uma certa dificuldade para caminhar. Certa ocasião, contou-nos que tinha sido uma mulher muito bonita antes de sofrer um ataque violento do marido (alcoolizado provavelmente) que a levantou pelo pescoço e fincou-lhe a cabeça repetidas vezes contra a parede, o que fez surgir, dentro de pouco tempo, um câncer na cabeça. O tumor pôde ser removido com sucesso mas o fato de ter passado por uma cirurgia delicada deixou-lhe essa sequela terrível para o resto da sua vida. Ela também dizia que não se separava porque era espírita e esse era o seu carma. Essa grande guerreira aguentou firme o tempo todo e hoje está bem melhor, viúva e seguindo em frente a sua vida, estudando e fazendo as suas peças de artesanato. Estes dois casos servem para ilustrar o drama por que passam milhares de mulheres em todo o mundo que sofrem violência doméstica e se calam em nome da religião, com medo da danação eterna. Isso sem falar nos outros tipos de violência que ocorrem nas ruas, nos ônibus, nas escolas, no Brasil e no resto do mundo que não são denunciados e, por isso mesmo, nem sempre chegam ao nosso conhecimento.

             O mundo está evoluindo, ou pelo menos, era para estar com toda essa tecnologia avançada e, portanto, não era mais para se ter notícias impactantes como essas que diariamente nos são apresentadas por todos os veículos de comunicação, causando-nos uma sensação de insegurança e impunidade.

                O machismo está fora de moda mas ainda hoje se percebem uns doentes que insistem em tratar as companheiras como seres inferiores, que não têm a mesma capacidade intelectual que eles acham que têm e isso para justificar escravizá-las na cozinha e nos afazeres domésticos quase sempre enfadonhos e estressantes.

            O machismo está fora de moda mas ainda hoje se encontram uns doentes que não respeitam as colegas de trabalho e soltam piadinhas indecorosas que, segundo a visão deles, deveriam ser consideradas como um elogio e não como um verdadeiro assédio. O que para eles é engraçado, para as mulheres é nojento e chocante.

               O machismo está fora de moda mas ainda hoje se acham uns doentes que vivem com a mentalidade pré-histórica que, quando sentem falta de uma fêmea, agarram à força a primeira que aparecer em seu caminho, esquecendo-se, ou melhor, ignorando que seria bem mais fácil e aprazível conquistá-la com a simpatia e bons modos.

               O   machismo está fora de moda mas ainda hoje existem uns doentes que se acham no direito de abusar das enteadas, das afilhadas, das próprias filhas e das filhas dos vizinhos porque estão dentro da sua própria casa e por isso mesmo disponíveis para tirarem vantagem dessa situação.

               



            O machismo está fora de moda mas ainda hoje têm uns doentes que consideram as mulheres como propriedades particulares, verdadeiros objetos adquiridos numa negociação e, por isso mesmo,  não admitem ser abandonados ou trocados por outro da mesma espécie, submetendo-as a toda sorte de violência, muitas vezes, fatal.

             Nada, absolutamente nada, justifica a violência do homem contra a mulher; do forte contra o mais fraco; do poderoso contra o indefeso. Nenhuma mulher deve aguentar calada o exercício machista sobre si mesma. Nenhuma religião vai salvá-la. Ninguém na rua ou dentro de casa irá acudí-la se ela não der o primeiro grito de socorro.  Ninguém poderá adivinhar o drama em que ela vive se não tiver a coragem  de abrir a porta e sair do inferno em busca de conforto e paz. Ninguém tem obrigação de tolerar os maus tratos a vida inteira. Ninguém precisa fazer o que não tem vontade. A violência só pode ser evitada quando a mulher deixa de ter medo e resolve lutar. Lutar, em primeiro lugar, pela sua integridade física, pela sua liberdade, pelo seu direito de ir e vir, pela sua voz e vez, pela sua dignidade e de seus filhos, por uma sociedade mais justa. E essa luta não se ganha ao lado do opressor, passando-lhe a mão na cabeça na esperança de que amanhã ele será melhor. Essa luta se vence bem longe dele, denunciando a violência, afastando-se dela porque ninguém vem ao mundo para sofrer e sim para viver em busca dos mesmos direitos a liberdade, a felicidade e ao amor.

                                                           Elisabeth Souza Ferreira

                                        Reflexão para o Dia Internacional da Mulher

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